Ajudante de suicida

sábado, março 31, 2007

O pERDEDOR

não há nada para entender
eu perdi
é só
não vamos fazer um drama por isso
por favor
conforme-se
não há nada pelo q chorar
é só vida
escorrendo
Eu nunca imaginei tudo isso
mas nunca é assim
nunca
preocupar-se só nos mata devagar
mas é o que eu o faço
mesmo assim
e o mundo nunca será como imaginamos
ainda que quase
desfeito
Meu senso de culpa me açoita
convencendo-me
sempre
E não concordo com o que eu falo
contradizo o que faço
e choro
A proxima vez pode ser outra
menos patética
talvez
Estou copletamente sozinho agora
não é novidade
nunca foi

segunda-feira, junho 19, 2006

O Fazer Esquecer ou um curto diálogo entre um gato e seu dono

Estava conversado com meu gato e concordamos que realmente somos sujeitos bem solitários. Um perto do outro, porém sós. Pensar na nossa situação nos leva inevitavelmente a admitir que somos tipos miseráveis. Claro, eu mais que ele. Digo isso porque ele tem a prerrogativa da ignorância. Eu não, desgraçadamente. Chihiro é o nome dele, sim, por causa filme. Pensei em apresentar ao Chihiro a noção de inevitável lhe mostrando a tradução de Black Star do Radiohead, chamando a sua atenção a para tragicidade do refrão: "culpe a estrela negra, culpe o céu que cai, culpe o satélite que me guia para casa". Mas ele não vai me ouvir. Ou antes, não vai me entender, daí desistirei. Chihiro agora dorme numa caixa de Mad Rats tamanho 41. Ele tece, distante, seu tempo ocioso enquanto eu escrevo algo vão, assim vamos ruminando nosso silêncio. Tentamos não pensar nisso, ou seja, nos divertir, como define Adorno, ou como acusa a terceira acepção posta no dicionário para este termo: fazer esquecer. Nossas duas pequenas vidas não tem sentido a não ser o que convencionamos para elas e são tão incoerentes quanto eu calçar 39/40.

terça-feira, maio 16, 2006

Dicas fashion de Madame Lulu

Oi gente. Hoje a dica é de como montar um look “retrô” super fashion. Como todos sabemos, a moda sempre revisita décadas passadas para buscar inspiração, e é comum reeditar estilos de outras épocas atualizando-os. Hoje vou mostrar para vocês três opções de looks inspirados em estilos consagrados que são vão ser as tendências do ano que vem e que tem tudo a ver com o tipo de música que faz a sua cabeça:

Estilo Hippie (anos 60/70):
Cabelos: não se preocupe em penteá-los, aqui a naturalidade de quem se levanta da cama de manhã e o tipo relaxado-casual são o que conta. Nem é preciso dizer que deixá-los sem ver água é essencial.
Para usar no dia-a-dia: tunicas e peças folgadas com aquela nhaca de roupa de duas semanas sem tirar é o mais recomendado. Nos modelos, muito colorido e estampas caleidoscópicas com temas que remetam à viagens lisérgicas.
Maquiagem: deixe o blush e o gloss de lado: não use coisa alguma. Se quiser ousar, bigodinho de leite e remela nos olhos podem ser o máximo.

Estilo Heavy-Metal (anos 80): (só para os rapazes)
Cabelos: obrigatoriamente longos e com uma maria-chiquinha para o eterno rabo-de-cavalo. Se forem curtos recorra a um megahair (mesmo que tenha que roubar o da sua irmã enquanto ela dorme). Só se solta o rabinho para tomar banho e olha lá. Dizem que se você tirar a maria-chiquinha seu cabelo cai. Em todo caso é melhor não arriscar.
Para usar no dia-a-dia: nada de cor. Você vai estar sempre com as peças combinando, pois só usará preto. Camisetas tem que ser de preferência com uma estampa de 1 m² e de bandas como Iron Maiden, Megadeth ou outra que o valha (contanto que não pequem pela discrição). Nos acessórios abuse do couro e das tachinhas e não se esqueça dos colares e anéis com motivos satânicos.
Maquiagem: esmaltes nas cores preto-catacumba, preto trevas-do-inferno e preto-lápis n.º 2 são sempre bem-vindos.

Estilo Poperô/Dance Music (anos 90):
Cabelos: tanto faz. Mas se quiser inovar, mechas e cortes a la Malhação são indicados.
Para usar no dia-a-dia: As Marca$, com cifrão maiúsculos, são a chave para montar seu look. As etiquetas devem ser sempre aparentes e grande$. Essa trica é tudo: camisetas Onbongo, bonés cobertos de bordados de times de basquetebol dos E.U.A. e tênis, claro. Os Nike Air já eram, agora o que está In são as molas, muitas delas. Tantas que te façam quicar caso você caia de um quinto andar.
Maquiagem: (só para as garotas). Carregue nas cores sem medo. Siga o melhor estilo p*** de 5 reais, tudo para ser digna de que algum cara de carro te convide para experimentar seu banco de trás.

domingo, maio 14, 2006

O enésimo sonho

"A minha rua era a única que possuia um restaurate que servia frango xadrez feito com carne de gato!? Mas nada da repugnâcia inspirada pelo sacrifício de animais domésticos, só uma timida vontade de provar dessa iguaria disparatada." Meus pesadelos regulares estão ficando bem mais elaborados e estranhos. Minha hipótese é a de que andei assistindo aquelas candidas reportagens sobre culinária vietnaminta, coreana, tailandesa, ou seja lá qual seja, onde se estripam filhotes de cachorro com facas de 30 cm. Também porque fora do meu estomago, a janta da quarta-feira retrasada deve ter continuado impregada numa memória secundária. Junte-se a isso o fato de meu gato ter pego e comido dois passarinhos dentro de casa e no mesmo dia, com direito a restos de sangue, penas e uma justo desdém para com a ração que o dono lhe administra.

quinta-feira, maio 04, 2006

O Senão do Tempo

O tempo, indiferente, me impelindo pr'adiante
sempre
Eu, perdido, caminho rumo ao longe
inconsciente
Os olhos, secos, distraídos de cansaço
se escondem
Nós, ausentes, esquecidos dos que somos
simples estranhos

quarta-feira, março 23, 2005

Enquanto meus ossos cresciam eles doíam*

Crescer é se domesticar (um processo que é sistematicamente imposto), me disseram. E viver é se empedernir, digo eu. Chega um tempo em que intimamente se diz: ontem foi a última vez que chorei. E esta é a certeza mais inexorável que se tem, mesmo que ela se mostre esporadicamente falsa. Não é uma promessa, antes uma constatação desiludida, um estado sóbrio onde se pode avaliar o que restou. Claro que não é válido para todos. Mas o que muda de uma pessoa para outra é o tipo de monstros que vão ter que enfrentar (Nietsche alertava que devia se ter cuidado para não se tornar um deles). O mundo conspira para que nos tornemos insensíveis, se utiliza do tempo para nos degenerar, nos deixando um corpo apenas. Um dia acordamos e percebemos o que aconteceu, e nos surpreendemos com a calma de quem olha e diz: já é dia. Com a alma roubada nos deixamos levar. Continuamos, automáticos, esperando amanhã. Trabalhando, conversando, fazendo coisas simples. Já não temos a consciência semi-presente que torna sempre iminente o possível.
Antigamente nos sentíamos felizes só de pensar que se chovesse naquela tarde comeríamos pipoca assistindo a um filme antes de cochilarmos de mau jeito no sofá. De qualquer forma a história não interessava mesmo. Era só uma das condições para um dia perfeito. Naquela época o mundo era um mistério infinito: as nuvens eram feitas de algodão, os sonhos de felicidade, o mar de imensidão, a existência de beleza, a beleza de mágica, e esta de momentos únicos em meio a outros sem importância.
A infância, porém, é esquecida antes de ser deixada para trás. E como adultos somos potenciais candidatos a pedregulhos. Até que chega-se a um tempo em que passa-se a acreditar que a antiga mágica da realidade é feita na verdade de truques baratos e sentimentais nos quais nunca se tinha prestado muita atenção. E um dia desprevenidamente se diz: grande merda. Então nos tornamos bruxistas diurnos com os olhos injetados de sangue ou somente ríspidos indiferentes.

(*) Serve the Servants - Nirvana

Rotina

Perturbado, andei por pura pirraça pisando apenas nas emendas das calçadas por onde passei. Inventei numa hora inútil uma nova filosofia para se viver da maneira errada, ignorando o bom senso e os costumes rançosos, um sistema minuciosamente imperfeito, que não garante minimamente a eficácia de si mesmo. Ri do que reluzia, medi o quanto imbecil é o valor dado às coisas, debochei de todas as verdades absolutas, considerei idiota tudo o que não tem preço. Troquei minha vida por um amor vão: vão porque acaba, vão porque tive que entregar minha vida para vivê-lo. Resolvi que não se escolhe as coisas, apenas se decide pelo mais suportável. Achei a existência estúpida e cruel a sua beleza. Tudo alternadamente, no eterno fluxo do novo, para fugir do tédio angustiante da espera. Me queimei, me cortei, me furei; mas só enquanto o flagelo dava lugar à desilusão. Insisti em fazer tudo do modo mais complicado possível. Enquanto não me ocupava com meu futuro permanente, eu dormia, exausto. Esperava acordar num dia bom. O dia em que te beijei. Pois já não sei o que fazer na maioria deles a não ser me repetir. Acho que deveria parar no meio da rua, sob da chuva, com a boca erguida para beber as gotas d’água, porque não há mais nada a fazer além disso, simplesmente porque a única coisa lógica que posso fazer é ficar assim, olhos no alto, tentando me resfriar persistentemente. Logo perceberia que mesmo se enchesse a barriga de água nem uma folha de árvore se desprenderia por minha causa. Depois iria embora vencido. Depois esperaria. Pelo tempo, por um sinal para assumir a posição seguinte, mais cômoda para sofrer, uma que esteja mais de acordo com meu sentido ridiculamente trágico da coisas. Resumi minha vida para que não ficasse tão grande. Mas cada fragmento continuava sendo ela própria. Me iludi pensando que não agüentaria, dividi meu cansaço pelos dias e me descobri um casmurro. Depois de tudo cheguei aqui, sozinho. Patético, ansioso, teimando acreditar. Não ganhei coisa alguma com isso. Mas, como é preciso fazer algo, eu espero.

sexta-feira, novembro 19, 2004

A multidão de apertadores de botão*

Num dos contos de Crônica de um amor louco, Bukowski descreve sua rotina de jogador. Ele gostava de apostar nos cavalinhos, como os chamava. E freqüentava o hipódromo mais de uma vez por semana. Porém, o maior de todos os inconvenientes para ele era ter que esperar cerca de uma hora entre uma corrida e outra, tempo demasiadamente longo para um misantropo que não era dotado de um grande talento para aturar estranhos e era obrigado a esperar com os outros. Enquanto isso, ele tomava alguma coisa ou elaborava mais um de seus sistemas de apostador, mas, mesmo assim, aquela era uma hora vazia. Um saco.

Essa rotina baseada na espera é compartilhada por bilhões de pessoas todos os dias. Não há nada de extraordinário nisso. Ser capaz de suportar a própria existência com ânimo é uma característica considerada inerente à maioria dos seres humanos. Além disso, abreviá-la só é o final de poucos: ou por preguiça ou por convicção. Seja como for, os dias têm que ser preenchidos de alguma forma. E eles o ocupam com seus trabalhos, bem pagos ou não, insuportáveis ou não, imbecis e inúteis ou não. Não raro sentem uma grande insatisfação por eles. São oito horas diárias estripando peixes, varrendo sarjetas, empilhando caixas, fazendo com que almofadinhas se sintam confortáveis, cortando a grama, atendendo gente reclamona que sempre acha que a culpa é sua, batendo à máquina, assentando tijolos, calculando, fazendo com que o banheiro de uma humilde mansão brilhe mais que as jóias da patroa, abastecendo carros, cuidando do dinheiro do banco, limpando vidros, catando lixo, garantindo a segurança de bacanas, oferecendo produtos inúteis por telefone, dirigindo ônibus, apertando botões.

Não é preciso ser ascensorista para ficar fazendo isto o dia todo. A massa infinita de indivíduos infelizes que moram alheados da riqueza parodiam triste e intermitentemente Chaplin em Tempos Modernos. Rosqueam porcas e enlouquecem. Manuseiam as máquinas como uma delas, absorvendo seu automatismo e regularidade, tudo em nome da eficiência. O tédio que daí advém é aplacado racionando as idéias e crendo na certeza da chegada da última hora para que se possa ir.

Luís Fernando Veríssimo escreveu uma vez que há dois tipos de pessoas que decidem sua vida: sua família e seus vizinhos. Seus pais, ou mais exatamente os genes deles, determinam se você vai ser um galã ou se vai sofrer comparações com dragões ou com outros seres medonhos. Já seus vizinhos (dependendo da potência do aparelho de som deles) vão decidir se você vai ouvir um bate-estaca ou Beethoven. Veríssimo só se esqueceu da terceira classe de pessoas tão influentes quanto as anteriores, que são os temidos colegas de trabalho. Baseando-se nas inequívocas propagandas de colchões, aqueles são como estes, ou seja, se passará pelo menos 1/3 da vida com eles. É por isso que facilmente podem se tornar seus algozes, principalmente dentro de um de seus habitats mais comuns: o escritório. Para quem ocupa um lugar mais ameno na escala de trabalhos considerados idiotas, o escritório é um dos locais mais aceitáveis. Neles não é incomum que se reine um certo clima nonsense, típico recurso mecânico para escamotear o asco do ambiente, para adiar que se mande tudo à merda ou para demonstrar que o que sempre se sobressai mesmo é o famoso senso de humor à brasileira. É a prática da filosofia do “fazer-o-que?”, “o que não tem remédio”...

Mais não só seus companheiros de jornada são culpados por seu fardo existencial. Eis aqui uma demonstração rasteira da teoria da causa e conseqüência: uma grã-fina discute com o marido, que é chefe de um sujeito; depois de levar um esporro do primeiro, este chega em casa e briga com a mulher, e esta premia com uma memorável surra o filho que, sem ter em quem descontar, chuta o cachorro, pois não consegue se conformar pela falta de consideração de não ter sobrado ninguém em quem ele pudesse descontar sua cólera. Finalmente o cachorro, com sua impetuosidade canina e frustrado depois da experiência com o menino, morde o carteiro. Então este sim encontra motivos suficientes para se achar descontente com seu emprego. Bukowski, que também foi carteiro, deve ter levado sua cota de mordidas e sabia exatamente que é preferível esperar a hora da próxima corrida do que gastar o dia esperando ele passar enquanto se entrega cartas. Mesmo que esta hora seja um saco.

(*Crônica escrita para o segundo jornal-laboratório da 3º ano de Jornalismo da UEL).