Enquanto meus ossos cresciam eles doíam*
Crescer é se domesticar (um processo que é sistematicamente imposto), me disseram. E viver é se empedernir, digo eu. Chega um tempo em que intimamente se diz: ontem foi a última vez que chorei. E esta é a certeza mais inexorável que se tem, mesmo que ela se mostre esporadicamente falsa. Não é uma promessa, antes uma constatação desiludida, um estado sóbrio onde se pode avaliar o que restou. Claro que não é válido para todos. Mas o que muda de uma pessoa para outra é o tipo de monstros que vão ter que enfrentar (Nietsche alertava que devia se ter cuidado para não se tornar um deles). O mundo conspira para que nos tornemos insensíveis, se utiliza do tempo para nos degenerar, nos deixando um corpo apenas. Um dia acordamos e percebemos o que aconteceu, e nos surpreendemos com a calma de quem olha e diz: já é dia. Com a alma roubada nos deixamos levar. Continuamos, automáticos, esperando amanhã. Trabalhando, conversando, fazendo coisas simples. Já não temos a consciência semi-presente que torna sempre iminente o possível.
Antigamente nos sentíamos felizes só de pensar que se chovesse naquela tarde comeríamos pipoca assistindo a um filme antes de cochilarmos de mau jeito no sofá. De qualquer forma a história não interessava mesmo. Era só uma das condições para um dia perfeito. Naquela época o mundo era um mistério infinito: as nuvens eram feitas de algodão, os sonhos de felicidade, o mar de imensidão, a existência de beleza, a beleza de mágica, e esta de momentos únicos em meio a outros sem importância.
A infância, porém, é esquecida antes de ser deixada para trás. E como adultos somos potenciais candidatos a pedregulhos. Até que chega-se a um tempo em que passa-se a acreditar que a antiga mágica da realidade é feita na verdade de truques baratos e sentimentais nos quais nunca se tinha prestado muita atenção. E um dia desprevenidamente se diz: grande merda. Então nos tornamos bruxistas diurnos com os olhos injetados de sangue ou somente ríspidos indiferentes.
Antigamente nos sentíamos felizes só de pensar que se chovesse naquela tarde comeríamos pipoca assistindo a um filme antes de cochilarmos de mau jeito no sofá. De qualquer forma a história não interessava mesmo. Era só uma das condições para um dia perfeito. Naquela época o mundo era um mistério infinito: as nuvens eram feitas de algodão, os sonhos de felicidade, o mar de imensidão, a existência de beleza, a beleza de mágica, e esta de momentos únicos em meio a outros sem importância.
A infância, porém, é esquecida antes de ser deixada para trás. E como adultos somos potenciais candidatos a pedregulhos. Até que chega-se a um tempo em que passa-se a acreditar que a antiga mágica da realidade é feita na verdade de truques baratos e sentimentais nos quais nunca se tinha prestado muita atenção. E um dia desprevenidamente se diz: grande merda. Então nos tornamos bruxistas diurnos com os olhos injetados de sangue ou somente ríspidos indiferentes.
(*) Serve the Servants - Nirvana